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- “Venha comigo,

deixe que os mortos enterrem seus mortos”


[enterro]
– “Eu estou contigo.
Porque em meio a tempestade
você é minha calmaria”



A hora Íntima

Quem pagará o enterro e as flores
Se eu me morrer de amores?
Quem, dentre amigos, tão amigo
Para estar no caixão comigo?
Quem, em meio ao funeral
Dirá de mim: — Nunca fez mal
Quem, bêbado, chorará em voz alta
De não me ter trazido nada?
Quem virá despetalar pétalas
No meu túmulo de poeta?
Quem jogará timidamente
Na terra um grão de semente?
Quem elevará o olhar covarde
Até a estrela da tarde?
Quem me dirá palavras mágicas
Capazes de empalidecer o mármore?
Quem, oculta em véus escuros
Se crucificará nos muros?
Quem, macerada de desgosto
Sorrirá: — Rei morto, rei posto
Quantas, debruçadas sobre o báratro
Sentirão as dores do parto?
Qual a que, branca de receio
Tocará o botão do seio?
Quem, louca, se jogará de bruços
A soluçar tantos soluços
Que há de despertar receios?
Quantos, os maxilares contraídos
O sangue a pulsar nas cicatrizes
Dirão: — Foi um doido amigo
Quem, criança, olhando a terra
Ao ver movimentar-se um verme
Observará um ar de critério?
Quem, em circunstância oficial
Há de propor meu pedestal?

Quais os que, vindos da montanha
Terão circunspecção tamanha
Que eu hei de rir branco de cal?
Qual a que, o rosto sulcado de vento
Lançara um punhado de sal
Na minha cova de cimento?
Quem cantará canções de amigo
No dia do meu funeral?
Qual a que não estará presente
Por motivo circunstancial?

Quem cravará no seio duro
Uma lâmina enferrujada?
Quem, em seu verbo inconsútil
Há de orar: — Deus o tenha em sua guarda.
Qual o amigo que a sós consigo
Pensará: — Não há de ser nada…
Quem será a estranha figura
A um tronco de árvore encostada
Com um olhar frio e um ar de dúvida?
Quem se abraçará comigo
Que terá de ser arrancada?



Quem vai pagar o enterro e as flores
Se eu me morrer de amores ?

 

 

 

 

 

Vinicius de Moraes
Rio, 1950

 

[amigos]

lobo



Seu ritual de despedida foi apenas um olhar de ternura.
Longe de sua alcatéia, o lobo já não é mais lobo.


É apenas um espectro.
Um fantasma vagando nos olhos negros da floresta.


Ele sente uma silenciosa força, um entendimento imediato,
um impulso de retornar a ser o que era antes de ser lobo.


Ainda vivo, ele observa os vermes festejando em sua carne.
Um predador se torna a presa de feras tão pequenas.


Agitam em seu cérebro neurônios preguiçosos e ele se lembra das caças em bando.
Suas derrotas e vitórias agora dançam distantes,
igualmente embriagadas e um amor indisível acorda em seu peito.
Fui lobo – ele pensa.


Uiva uma última vez,
assinando no assombro de pequenos roedores sua despedida.
Cansado, o lobo deita e pouco a pouco,
seu corpo toma a baixa temperatura da relva.
Sua floresta é um denso esquecimento.
Agora a lua orbita em seus olhos.
As águas de um rio próximo ecoam distantes,
e o lobo mergulha em sua própria escuridão.


[do reader]

lobo





Estamos indo, de volta pra casa…









li ou ouvi hoje em algum lugar.


espelho

ta aí!
boa pergunta!


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